Hoje por um acaso falamos também sobre libélulas.
Poucos se dão conta de que também existem insetos ameaçados de extinção. A pequena divulgação sobre o assunto e a falta de informação de que os mesmos são tão importantes no equilíbrio ambiental quanto os outros animais, aliados à pouca simpatia que exercem nas pessoas em geral, faz com que poucos saibam da existência desses pequenos seres em perigo, como as borboletas, com 28 espécies ameaçadas, e as libélulas, que serão apresentadas nesta matéria, com cinco espécies ameaçadas e uma provavelmente extinta. Existem no Brasil mais de 1.200 das 5.000 espécies de libélula que povoam o mundo inteiro. Apesar das várias denominações vulgares, como lavadeira, cavalinho do diabo, pito, e canzil, seu nome mais comum, libélula, pode ter-se originado dos termos latinos, libellulus, o diminutivo de livro (liber), devido à semelhança de suas asas com um livro aberto, ou libella, que significa balança, e aí o movimento de suas asas, que oscilam levemente durante o vôo, daria respaldo a esta interpretação. Graças ao fantástico aparelhamento biológico que possui, uma libélula consegue planar, o que é impossível para a maioria dos insetos alados. Enquanto uma abelha vibra suas asas 4 vezes por segundo e muitos mosquitos imprimem até 8 batidas, a libélula bate suas asas 50 vezes por segundo. De acordo com a espécies, o tempo de vôo pode variar de dias, como ocorre com as espécies migratórias que possuem asas mais largas e conseguem planar nas correntes aéreas, a alguns minutos por dia. Em média, elas se mantêm voando por 5 a 6 horas diariamente. O absoluto controle de vôo da "demoiselle" (senhorita, como a libélula é chamada pelos franceses), inspirou o brasileiro Alberto Santos-Dumont na criação de seu modelo mais bem sucedido: o Demoiselle. Irrequieta, voando incessantemente, planando, dando rasantes, subindo ou pousando como um helicóptero, a libélula parece ter sempre muita pressa. E motivos não faltam para isso. Toda libélula está sempre vivendo o ponto culminante de sua vida e não tem tempo a perder. Deve procurar parceiros e acasalar em um prazo máximo de dois meses __ tempo entre sua última metamorfose, quando de larva se transformou em libélula, e sua morte __, que corresponde, em algumas espécies, a menos de 10% de seu tempo total de vida. Será preciso entender rapidamente as regras do jogo no novo ambiente, aprendendo a evitar seus predadores e caçando suas presas. Aparelhada com o maior olho proporcional do reino animal, a libélula usa seu sofisticado aparelho visual como um radar. Posicionando-se sempre contra a luz solar, é capaz de detectar movimentos imperceptíveis aos nossos olhos. Em centésimos de segundo, ela identifica se é uma presa, um predador, um rival ou uma possível parceira. Aos inimigos, a lei-do-mais-forte. Aos machos rivais, um violento ataque servirá para marcar presença no território. Caso seja uma fêmea, será o início de um complicado malabarismo, essencial para a preservação da espécie. A cor definitiva do corpo e da asa das libélulas demora alguns dias para se fixar, seguindo diversos matizes de azul, amarelo e vermelho. Em algumas espécies a coloração predomina nas asas, enquanto outras possuem o abdômen colorido e asas transparentes. As cores chamativas e dois pares de asas que não se dobram as tornam incapazes de esconder-se na vegetação, representando uma desvantagem competitiva. Os olhos com visão panorâmica e a habilidade de voar verticalmente, contrabalançam esta equação evolutiva, que tem sido favorável às libélulas.
Caçador e caça
Predadora voraz em seu ambiente, a libélula é capaz de comer 14% de seu peso se alimentando apenas de outros insetos voadores __ abelhas, moscas, besouros, vespas, outras libélulas menores, pernilongos e até o mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue __ em um único dia de sua curta existência fora da água. Vivendo apenas de um a dois meses com suas asas, depois de ter passado até cinco anos no ambiente aquático, ela tem pouco tempo para encontrar parceiros e procriar, antes que um predador a encontre primeiro. Recentes pesquisas demonstraram que um pequeno besouro realiza por dia cerca de 150 vôos, conseguindo um índice de sucesso nas caçadas de 43% e comendo 11% do seu peso. Já a libélula, mesmo com pouco tempo de "brevê", realiza duas vezes mais vôos e tem sucesso em 51% de suas investidas. Enquanto vive na água, a libélula tem de fugir dos sapos, peixes e pássaros. Com asas, ela terá outros inimigos: aranhas, louva-a-deuses e outros pássaros.
Se tem libélula, a água está limpa
Quem tiver dúvidas quanto à qualidade da água de um rio ou lago pode fazer o "teste da libélula", que consiste na simples observação se há libélulas na área. Todo rio ou lago com águas limpas tem libélula. No entanto, a menor alteração físico-química da água ou do ar já será suficiente para expulsá-las, além de impedir que dos ovos saiam novas larvas. Deste modo, a presença do inseto funciona como um excelente bioindicador da qualidade do meio ambiente. A grande ameaça à vida das libélulas é a poluição ambiental. Na água, a poluição provoca mudanças drásticas em suas características físicas, como os sedimentos em suspensão, e químicas, tais como alteração do PH, da condutividade e do nível de oxigênio dissolvido na água. No ar, ocorrem processos semelhantes, incluindo as mudanças climáticas.
Duas metades de um só coração
O tempo de procriação pode variar de alguns minutos em pleno vôo até várias horas de um acasalamento pousado. O que não muda é a posição insólita em forma de coração, formado pelo corpo retorcido do macho e da fêmea. Quando o macho está na presença da fêmea, ele precisa encostar seu pênis, localizado no segundo segmento de seu abdômen, no nono (e penúltimo) segmento, onde são produzidos os espermatozóides. Depois de transportar seu próprio esperma até o pênis, o macho segura a fêmea pela cabeça com uma pinça localizada na extremidade de seu corpo. A fêmea, então, faz também um contorcionismo para que seu órgão genital, localizado no penúltimo segmento, encontre o pênis do macho, formando o coração. Depois da fecundação, os ovos são liberados dentro da água ou em alguma planta submersa.
A larva se transforma em avião
Duas a três semanas depois de postos os ovos, surgem as larvas das libélulas. Começa então um longo ciclo de vida aquática, que, em algumas espécies, pode durar até cinco anos. Em sua existência submersa, a larva se alimentará de micro-crustáceos, filhotes de peixes e outras larvas __ ela atua como ápice de uma importante cadeia alimentar dos ambientes aquáticos dos rios e lagos __ e passará por até 15 sucessivas metamorfoses até se transformar em uma naiade, que já se assemelha ao inseto adulto porém se movimenta no meio aquático através de jatos de água que saem pelo reto, como um sifão. Em um dado momento, atendendo aos chamados de um relógio biológico, cujo mecanismo permanece inexplicado, a naiade faz a transição do meio aquático para o terrestre onde fará sua última metamorfose. A escalada do trampolim para o novo mundo é feita geralmente à noite, para escapar dos predadores. Subindo pela haste de alguma planta, a larva para de se alimentar e se mantém várias horas imóvel se preparando para a mudança. A libélula rompe seu último exoesqueleto pelo dorso, liberando primeiro a cabeça e o tórax e depois o abdômen (o processo leva de 30 a 40 minutos). Suas asas, úmidas, precisarão de duas a três horas para se solidificarem em contato com o ar, quando a libélula estará, então, aparelhada e pronta para decolar.
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