Admite-se que as primeiras células que surgiram na Terra foram os procariontes. Isto deve ter ocorrido há 3 bilhões de anos, no começo do período pré-cambriano. Naquela época, a atmosfera provavelmente continha vapor d’água, amônia, metano, hidrogênio, sulfeto de hidrogênio e gás carbônico. O oxigênio livre só apareceu muito depois, graças a atividade fotossintética das células autotróficas.
Antes de surgir a primeira célula, teriam existido grandes massas líquidas, ricas em substâncias de composição muito simples. Estas substâncias, sob a ação do calor e radiação ultravioleta, vindas do Sol e de descargas elétricas oriundas de tempestades frequentes, combinaram-se quimicamente para constituírem os primeiros compostos contendo carbono. Substâncias relativamente complexas como proteínas e ácidos nucleicos, que nas condições terrestres atuais, só se formam pela ação das células ou por síntese nos laboratórios químicos, teriam aparecido espontaneamente, ao acaso. Esse tipo de síntese, realizada sem a participação de seres vivos, é denominada abiótica. Conclui-se que o acúmulo gradual dos compostos orgânicos enumeradas só foi possível porque a atmosfera não continha oxigênio. Na presença deste gás, aquelas moléculas seriam oxidadas e não se acumulariam.
AS PRIMEIRAS CÉLULAS: PROCARIÓTICAS
Não se tem certeza ainda da data exata do surgimento do primeiro ser vivo. Os cientistas têm encontrado indícios de vida em rochas que datam de 3,8 bilhões de anos na Groenlândia, mas esses indícios baseiam-se em formas do carbono que representam a atividade metabólica de seres vivos. O registro fóssil mais antigo de um ser vivo que se conhece até hoje data de cerca de 3,5 bilhões de anos.
Seres como esses foram encontrados em rochas chamadas estromatólitos (stroma = cama; lithos= rocha), no sul da África e oeste da Austrália. Os estromatólitos são rochas sedimentares muito semelhantes aos “tapetes” estratificados formados atualmente em algumas lagunas de oceanos de águas quentes. Cada estrato é formado por sedimento, que fica aderido à cobertura gelatinosa que reveste o corpo de cianobactérias e bactérias. Esses organismos migram constantemente para fora dessa camada e novamente há deposição de sedimento. O processo se repete, dando origem ao padrão estratificado, típico desses “tapetes”.
Os fósseis mais antigos encontrados nos estromatólitos parecem ser de procariontes fotossintetizantes e, portanto, produtores de oxigênio. Se isso for verdade, é muito provável que a vida tenha surgido muito antes, possivelmente há 4 bilhões de anos, somente 500 milhões de anos após a formação da Terra! Isso porque se supõe que seres fotossintetizantes não tenham sido as primeiras formas de vida em nosso planeta e que não havia oxigênio na atmosfera primitiva.
A quantidade de oxigênio formada inicialmente por esses primeiros seres fotossintetizantes não devia ser suficiente para que ele se acumulasse na atmosfera (o que deve ter ocorrido cerca de 1 bilhão de anos depois). O oxigênio é muito reativo, e à medida que ia sendo formado reagia com muitos elementos.
Com a proliferação dos seres fotossintetizantes, maior quantidade de O2 começou a ser produzida.
Assim, apesar de continuar reagindo com outros elementos como faz até hoje, foi possível o acúmulo de oxigênio livre na atmosfera. De acordo com registros fósseis, a presença substancial de oxigênio na atmosfera deve ter ocorrido há cerca de 2,5 bilhões de anos, o que propiciou o surgimento de vida aeróbia.
À medida que a evolução dos procariontes continuou, alguns ficaram restritos a viver sem oxigênio, enquanto outros começaram a fazer uso desse gás num novo processo metabólico: a respiração.
Dentre os seres vivos, os procariontes são os que apresentam a maior diversidade metabólica, o que se verifica desde os primórdios de sua evolução. Eles foram os únicos seres vivos na Terra por cerca de 2,3 bilhões de anos e até hoje são muito importantes para a vida em nosso planeta.
Estudos atuais têm demonstrado que dois grupos distintos de procariontes divergiram muito cedo na história evolutiva da vida: o grupo das arqueobactérias (Archaea) e o das bactérias ou eubactérias (Eubacteria). Esses dois grupos quando tratados conjuntamente são denominados moneras. O termo arquea (archaio = antigo) refere-se à antiguidade da origem do grupo a partir das primeiras células que surgiram em nosso planeta. As arqueobactérias vivem hoje em locais onde as condições ambientais são inóspitas, como fontes termais e águas muito salinas. Entretanto, recentemente estudos têm revelado a presença delas em ambientes marinhos onde as condições não sejam extremas. A maioria dos procariontes atuais pertence ao grupo das bactérias, incluindo aí as cianobactérias.
SURGIMENTO DAS CÉLULAS EUCARIÓTICAS
O registro fóssil da primeira célula eucariótica data de 1,7 bilhão de anos, mas supõe-se que os eucariontes tenham surgido um pouco antes.
As primeiras células eucarióticas teriam surgido a partir das células procarióticas que passaram a desenvolver evaginações e invaginações da membrana plasmática, tornando-se maiores e mais complexas. Esses dobramentos teriam dado origem às várias estruturas citoplasmáticas delimitadas por membrana e à carioteca ou envelope nuclear, que separa o material genético do citoplasma, formando o núcleo.
POR QUE TANTAS MEMBRANAS INTERNAS?
As células eucarióticas possuem várias estruturas internas delimitadas por membranas, enquanto as células procarióticas não as possuem. A explicação provável para essa complexa profusão de membranas internas parece estar relacionada com a proporção relativa entre superfície e volume. As células eucarióticas têm geralmente volume muito maior que as procarióticas (cerca de 1000 vezes ou mais) e têm, proporcionalmente, quantidade muito maior de materiais celulares. Uma célula humana, por exemplo, contém cerca de 800 vezes mais DNA que uma célula bacteriana!
Sabe-se da geometria elementar que o volume corresponde ao cubo da dimensão linear,enquanto a área superficial equivale ao quadrado dessa dimensão. Considerando que todos os materiais necessários para as reações biológicas intracelulares devem entrar e sair da célula, passando através da membrana plasmática que reveste toda a superfície celular, e considerando que muitas reações importantes ocorrem associadas às membranas, o aumento no volume celular requer aumento na superfície das membranas.
As células procarióticas apresentam superfície celular adequada em relação ao volume. Já as células eucarióticas mantêm essa relação graças a um aumento suplementar da superfície, decorrente de elaboradas invaginações e evaginações de sua membrana, originando as diferentes estruturas membranosas do citoplasma, com exceção das mitocôndrias e dos cloroplastos.
Dentre as estruturas membranosas, apenas as mitocôndrias e os cloroplastos parecem ter tido origem diferente das demais. As mitocôndrias são responsáveis pela respiração celular, ocorrendo em praticamente todos os eucariontes. Os cloroplastos são responsáveis pela fotossíntese e estão presentes apenas nas plantas e nas algas unicelulares (como euglenas e diatomáceas) e multicelulares.
Supõe-se que os primeiros eucariontes eram anaeróbios e tinham por hábito englobar bactérias como alimento. Em algum momento da evolução desses organismos, algumas dessas bactérias, que já tinham capacidade de realizar respiração, teriam sido mantidas no citoplasma dos eucariontes e não teriam sido degradadas. Essa associação teria trazido benefícios tanto para os eucariontes como para as bactérias. Por realizarem a respiração, as bactérias teriam trazido vantagens aos eucariontes, pois a respiração é um processo de liberação de energia dos alimentos muito mais eficiente que a fermentação. Para a bactéria, a associação também teria sido vantajosa, pois ela recebia proteção e nutrientes dos eucariontes. Essa relação de simbiose do tipo mutualismo, com benefícios para ambos os indivíduos, teria se perpetuado, e essas bactérias teriam dado origem às atuais mitocôndrias.
Algum tempo depois de estabelecida essa relação, alguns eucariontes iniciaram outra simbiose,desta vez com cianobactérias. Estas realizavam a fotossíntese para o eucarionte e dele recebiam proteção.
Essa relação mostrou-se tão vantajosa que se perpetuou, e essas cianobactérias teriam dado origem aos atuais cloroplastos.
HIPÓTESE SIMBIÓTICA SOBRE A ORIGEM DAS MITOCÔNDRIAS E DOS CLOROPLASTOS: EXISTEM EVIDÊNCIAS CIENTÍFICAS QUE A APOIEM?
Pode parecer muito estranho que nossas mitocôndrias tenham sido bactérias e que os cloroplastos das plantas tenham sido cianobactérias!
Mais estranho ainda é imaginar que a linhagem dos seres eucariontes aproveitou-se de mecanismos que surgiram na linhagem dos procariontes, como foi o caso da respiração e da fotossíntese, e incorporaram esses mecanismos de um modo bastante peculiar; ingeriram os procariontes que apresentavam essas vias metabólicas e não o digeriram, guardando-os em seu próprio benefício.
Parece que as coisas aconteceram assim mesmo. Existem fortes evidências a favor dessa hipótese.
A primeira evidência refere-se ao fato de que os atuais cloroplastos e mitocôndrias são as únicas estruturas citoplasmáticas que possuem seu próprio material genético. Possuem ácidos nucleicos próprios e são capazes de se dividir independentemente da divisão da célula. Além disso, esse material genético comanda uma série de reações dentro dessas estruturas que não dependem do comando do material genético da célula.
Outras evidências baseiam-se na análise do que acontece com alguns organismos que vivem atualmente em nosso planeta. Por exemplo, existe uma espécie de ameba de água doce, denominada Pelomyxa palustris, que não possui mitocôndrias. Entretanto, essa ameba abriga em seu citoplasma bactérias que fazem a respiração, vivendo em simbiose permanente com ela. Existem também vários casos de organismos eucariontes atuais que apresentam simbiose permanente com cianobactérias, como acontece com a espécie Cyanophora paradoxa.
Esses exemplos de seres atuais que possuem bactérias ou cianobactérias em simbiose dentro de suas células nos dão indícios de que esse tipo de relação pode perfeitamente ter ocorrido ao longo da evolução das células eucarióticas.
AMABIS e MARTHO,Biologia das Célula Ed. Moderna, 2009
ARMÊNIO e ERNESTO, Biologia 1 , Ed Harbra , 2002
CESAR e SEZAR, Biologia 1, Ed. Saraiva, 2002
LOPES Sonia, Bio 1, Ed. Saraiva, 2006
3 comentários:
Sensacional! Os livros de Ensino Médio parecem simplesmente ignorar a existência dos estromatólitos, pois há tempos procuro neles essa analogia que foi feita no post. Excelente abordagem.
Parabéns! Excelente trabalho, muito boa essa explicação.
Show de bola.... muito bom!!!
Seu blog ajudou muito tanto a mim... quanto a vários alunos!!!
Postar um comentário